8 de outubro de 2009

E o desperdício continua




Washington Novaes - O Popular - 08/10/09


Texto de Adriano Marquez Leite neste jornal (30/9) informa que, passados dois anos, continua paralisado o projeto de implantar uma usina de triagem e reciclagem para resíduos de construção (entulhos) em Goiânia. Já há uma área de 40 hectares escolhida, ao lado do atual aterro de resíduos, na saída para Trindade. E a implantação deverá custar R$1,2 milhão, para permitir o reaproveitamento de aço, plásticos e outros materiais. Mas não anda. Enquanto isso, continua a ser recolhida uma tonelada por dia de entulhos ao aterro geral – apressando seu fim de vida (embora seja novo, da década de 90), já muito próximo, tanto que se cuida de sua expansão.

O recolhimento ao aterro (que também é um desperdício de materiais) é bastante menor que a produção dos entulhos, superior a duas toneladas/dia. Fala-se até em três toneladas diárias, bem mais que os resíduos domiciliares e comerciais (cerca de 1,3 tonelada/dia). Seriam de 60 a 90 toneladas/mês, ou cerca de 1 milhão de toneladas anuais, 1 bilhão de quilos, cerca de 800 quilos por goianiense.


Enquanto não se resolve a questão, a Comurg usa oito caminhões e gasta cerca de R$500 mil por mês para recolher uns 30% dos entulhos, dizem outras fontes. Na verdade, só deveria recolher os resíduos colocados em 12 ecopontos autorizados. Mas os entulhos se espalham pela cidade, deixados na calada da noite por quem não quer ter nem trabalho nem despesa.


Além de apressarem o fim dos aterros (e custa muito implantar outro, além de ser dificílimo encontrar área adequada), os resíduos sepultados são um desperdício enorme. Em usinas, pode-se separar brita, areia, metais, plásticos e reaproveitá-los ou reciclá-los. Além disso, existem usinas móveis, que podem deslocar-se entre as várias áreas autorizadas a receber entulhos e facilitam a operação.


O problema está na atribuição de custos. Em princípio, eles devem caber a quem gera os resíduos – e é esse caminho que tem permitido resolver adequadamente o problema nos países que mais êxito tiveram (Alemanha, Suécia, Noruega, Dinamarca e outros). Aqui, os geradores dizem que os custos devem caber ao poder público – isto é, a toda a sociedade (que paga os impostos e não se beneficia das obras).


Não é diferente da situação do lixo em geral, onde também é enorme a resistência de todos os geradores a arcar com os custos. Os muitos projetos no Congresso Nacional empacam sempre nesse item - como acontece agora com o projeto da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que já é uma coleção de dispositivos praticamente inócuos.


Enquanto se segue por aí, o País continua gerando, segundo o IBGE (2002), cerca de 220 mil toneladas diárias só de resíduos domicilares e comerciais, isto é, mais de 1 quilo de lixo por dia por pessoa – sem falar em que uns 20% do lixo, pelo menos, sequer são recolhidos: despejam-se nas ruas, nos rios, entopem redes de drenagem, são um problema grave.


O desperdício é enorme, inclusive no lixo aterrado, porque quase tudo que está aí contido poderia ser reutilizado, reciclado ou ter outras destinações. Trabalho recente da Unesp de Sorocaba mostrou que 91% das 110 toneladas de materiais sepultados a cada dia no aterro da cidade de Indaiatuba poderiam ser reaproveitados ou reciclados. Não é diferente da experiência do Núcleo Industrial de Reciclagem de Goiânia que, no início de suas atividades em cinco bairros, quando tinha todas as condições e remuneração adequada, só enviava para o aterro 20% do lixo por ele recolhido – o restante era transformado em fertilizante (materiais orgânicos compostados), telhas de papel e papelão revestidas de betume (substituem com muitas vantagens as telhas de amianto), PVC (reciclado em pets vendidos a indústrias de plástico, mas que também pode ser transformado em mangueiras pretas). As latas de alumínio eram revendidas para indústrias recicladoras, assim como outros metais e vidro moído. E tudo feito por uma cooperativa de pessoas antes desempregadas, que foram treinadas para operar e administrar uma usina.


Esse deveria ser o caminho no País todo, que, no entanto, só recicla em usinas 1% do lixo total. A situação só não é muito mais grave porque temos de Norte a Sul cerca de 1 milhão de catadores, que conseguem encaminhar para empresas recicladoras cerca de um terço do papel e papelão descartados, uns 20% do vidro, grande parte das latas de alumínio e do pet.


O Brasil deveria implantar e entregar aos catadores usinas em todo o País, além de equipamentos de coleta – e tornar obrigatória a coleta seletiva já na origem. Há poucos dias, o ministro do Meio Ambiente anunciou que será criado o Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos, assim como a garantia de preços mínimos para os materiais recolhidos pelos catadores. O Ipea ainda vai estudar o valor a ser pago por material.


É elogiável. Mas é preciso correr. Os municípios brasileiros gastam hoje, em conjunto, entre R$ 6,5 e13 milhões por dia (depende do lugar) com empresas que coletam lixo domiciliar e comercial (aí não se incluem os custos do lixo industrial, hospitalar, tóxico e outros) e o levam para aterros – que custam outra fortuna para administrar. Só na coleta, portanto, entre R$ 2 e 4 bilhões por ano, aos quais deve ser adicionada a despesa na gestão dos aterros. Para desperdiçar materiais.


Isso é que é ser rico pródigo.


Washington Novaes é jornalista

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